Palestra

16 de março de 2018

Como a física pôde estudar os restos mortais dos primeiros imperadores do Brasil

Inserida na programação da SIFSC-2015 – Semana Integrada do Instituto de Física de São Carlos, ocorreu no dia 29 de setembro, cerca das 19 horas, no Auditório Prof. Sérgio Mascarenhas (IFSC/USP), mais uma edição do programa Ciência às 19 Horas, que na circunstância trouxe a Profa. Dra. Márcia de Almeida Rizzutto, docente e pesquisadora do Instituto de Física da Universidade de São Paulo, que apresentou a palestra intitulada Primeiros imperadores do Brasil: a física pôde estudá-los!

A apresentação de Márcia Rizzutto deu ênfase ao fato de, em 2012, ter sido realizada uma pesquisa multidisciplinar nos restos mortais do Imperador D. Pedro I e de suas esposas – D. Leopoldina e D. Amélia -, que se encontram depositados na Capela Imperial do Monumento à Independência, em São Paulo. Como é do conhecimento público, D. Pedro I é uma das principais personalidades da história do Brasil, tendo sido, durante sua liderança, o principal responsável pela proclamação da independência do Brasil de Portugal, em 1822, fundando assim o Império do Brasil no mesmo ano.

Este trabalho de arqueologia multidisciplinar envolveu vários grupos de pesquisadores com metodologias de análises complementares, um trabalho complexo que também utilizou vários estudos físico-químicos para entender os materiais e as condições de conservação, ou não, dos restos mortais dos imperadores do Brasil. Particularmente, o Instituto de Física da Universidade de São Paulo, através do grupo de física aplicada com aceleradores, auxiliou na caracterização dos materiais dos objetos existentes nos restos mortais dos imperadores.

Nesta palestra, Márcia Rizzutto mostrou como as análises por metodologias físicas permitiram compreender melhor a composição química dos objetos (metais, ossos, tecidos, etc.), associados aos remanescentes humanos, bem como as degradações ocorridas devido à contaminação sofrida no ambiente em que os materiais foram encontrados.

De fato, esse trabalho iniciou-se a partir de um projeto de mestrado em Arqueologia da historiadora Valdirene Ambiel, cuja proposta foi estudar os remanescentes humanos dos imperadores e de suas esposas. Ela fez esse projeto dentro do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP, inserido no sistema de pós-graduação, obviamente com todas as autorizações junto ao IPHAN e aos descendentes da família imperial. A ideia foi questionar quais técnicas – físicas, químicas, biofísicas, de geociência – seriam utilizadas e como poderíamos estudar esses objetos para conseguir tirar, ou obter, a maior quantidade de informações possíveis.

Devido às técnicas, houve parcerias com cerca de dez instituições e de vários pesquisadores que auxiliaram no trabalho. O projeto foi gerado no MAE – Museu de Arqueologia e Etnologia, da Universidade de São Paulo, e teve a participação do IPEM – Instituto de Pesos e Medidas, para que se pudessem fazer todas as coletas de gases. Não sabíamos quais seriam as condições que encontraríamos ao abrir esses corpos, então houve uma preocupação muito grande com contaminação. Foi feito um pedido para que fosse realizada uma cromatografia gasosa, para que pudéssemos identificar se havia algum perigo nesse sentido. Depois, o pessoal da Microbiologia da USP fez toda uma coleta para crescer fungos e bactérias, com o intuito de analisar quais danos esses organismos poderiam causar, para que, depois, pudéssemos fazer as análises. Então, nesse inventário, foram discutidas todas as possibilidades, que incluíram a coleta e abertura dos caixões, porque havia questionamentos sobre os corpos, principalmente sobre o de D. Pedro. Fizemos um cronograma com algumas questões sobre as análises que seriam feitas caso os corpos estivessem em determinadas condições, etc, conta Márcia Rizzutto.

Em um primeiro momento, a ideia foi fazer a radiografia, porque sabia-se da existência das ossadas e haviam questionamentos sobre as doenças e causas da morte da Dona Leopoldina e do próprio D. Pedro. Tanto para a pesquisadora, como para seus colegas, foi muito interessante, porque a Faculdade de Medicina absorveu a ideia e conseguiu-se fazer as tomografias, que foram executadas pela Faculdade de Medicina. Os corpos foram retirados do mausoléu durante o período da noite, prolongando-se o trabalho por toda a madrugada, com todo um sistema complexo e sob sigilo absoluto, no sentido de salvaguardar eventuais sensacionalismos da mídia. Fomos até o Hospital Universitário, pegamos os três corpos, fizemos as tomografias e trouxemos os corpos de volta. Mas a Faculdade de Medicina se empenhou em fazer e auxiliar as análises. Muitas das informações obtidas com as tomografias serão usadas pela Valdirene em seu projeto de doutorado, já que agora ela também está mais vinculada à Faculdade de Medicina. Esse trabalho foi realizado durante o ano de 2012 e terminou em 2013. Agora ela está no meio do doutorado, então foi um rico material para o mestrado, no qual Valdirene focou bastante na parte histórica e arqueológica, comenta Márcia Rizzutto.

Este trabalho revelou, por exemplo, que D. Pedro I fraturou ao longo de sua vida quatro costelas do lado esquerdo, consequência de dois acidentes — uma queda de cavalo e quebra de carruagem. Isso teria prejudicado um de seus pulmões e, consequentemente, agravado uma tuberculose que causou sua morte aos 36 anos, em 1834.

(Rui Sintra – jornalista)

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